quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Ibama do Rio devolve 300 animais à natureza

Ibama
Jabutis: de volta a seu habitat de origem
Operação de soltura será realizada pelas superintendências do Ibama no Rio, no Espírito Santo e na Bahia.





Por Nelson Feitosa, da Ascom/Ibama
Duzentos e oitenta e seis animais silvestres apreendidos em cativeiros ilegais no Rio de Janeiro pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) foram reabilitados e serão devolvidos à região de ocorrência, em Porto Seguro, no sul da Bahia.
A operação de soltura dos 274 jabutis, 11 pássaros e uma iguana será realizada pelas superintendências do Ibama no Rio, no Espírito Santo e na Bahia, com apoio da Marinha. Antes disso, passarão por um período de recuperação no Centro de Triagem (Cetas) de Porto Seguro, que inclui exames clínicos e marcação individual para futura identificação.
COMPRADORES
Os animais foram reabilitados no Cetas do Rio e chegaram ao Nordeste nesta quarta-feira (11/11). Todos serão soltos em uma área protegida na localidade de Tremendal. “Muitos animais retirados das matas do Norte e Nordeste são levados ilegalmente para o Sudeste. O tráfico só ocorre porque existem compradores. É importante conscientizar as pessoas para que não comprem animais de origem ilegal”, diz a analista ambiental Taciana Sherlock, do Núcleo de Biodiversidade do Ibama no Rio.
Segundo ela, as espécies de maior ocorrência são pássaros, quelônios e primatas. “A maioria dos animais que chegam ao Cetas do Rio é de outras regiões do País. Esse processo de retorno à região de ocorrência é muito trabalhoso”, acrescentou.
O Centro de Triagem de Animais Silvestres recebe espécies apreendidas em operações contra o tráfico, resgatadas ou entregues de forma voluntária. O processo de reabilitação não é o mesmo para todos. “Alguns animais que estão acostumados com a presença humana demoram mais tempo para serem reabilitados”, diz Taciana. “Trabalhamos com alguns papagaios que levam até seis meses para voltar à natureza.”

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Conhecer para conservar: o lado ambientalista de um mecenas carioca

Por Pedro da Cunha e Menezes
Raymundo Ottoni de Castro Maya, ou simplesmente Castro Maya. Foto: Acervo Museu Castro Maya
Raymundo Ottoni de Castro Maya, ou simplesmente Castro Maya. Foto: Acervo Museu Castro Maya
Corre o ano de 2015. A cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro comemora 450 anos de sua fundação. A data é auspiciosa para recordar o nome de um de seus mais prodigiosos filhos: Raymundo de Otonni Castro Maya, que entre outras funções, em 1965, coordenou as comemorações do Quarto centenário da Cidade Maravilhosa. Não é esse lado de Castro Maya, contudo, que queremos aqui ressaltar, mas sim sua veia conservacionista. O que hoje conhecemos por movimento ambientalista é, na verdade, a soma de várias escolas de preservação que nasceram de diferentes necessidades e anseios de conservar a natureza ao longo da História. As iniciativas mais antigas de conservação de que se tem notícia no mundo ocidental em geral visavam a assegurar recursos hídricos para as cidades romanas. Exemplo paradigmático é a Floresta de Belgrado, criada em meados do primeiro milênio em Constantinopla para proteger os mananciais da então capital do Império Romano do Leste, maior potência da época. Mais tarde, à medida que a agricultura e a retirada de madeira para aquecimento, cozinha e construção civil foram desnudando a Europa, algumas reservas ganharam cercas para proporcionar a sobrevivência de animais de caça, esporte predileto da nobreza. Paradoxalmente, o gosto pelo abate de animais selvagens foi o que permitiu a sobrevivência de várias espécies de mamíferos na Europa. Também, em muitos países, foram decretadas regras e interdições para assegurar a preservação de árvores cujos caules fossem usados na construção naval. No Brasil, com esse objetivo, o Governo colonial protegeu diversas espécies que, em seu conjunto, acabaram por ficar conhecidas como “madeira de lei”.
"Somente no século XIX ganha força a ideia de se proteger áreas naturais para a recreação e contemplação. Seu principal defensor foi John Muir, um escocês educado nos Estados Unidos."
Outros usos como o religioso e a coleta de ervas medicinais também ajudaram a proteger nacos de terra. Em Portugal encontramos a Floresta Nacional do Buçaco, que foi replantada a partir de 1628 por monges carmelitas. O reflorestamento deu certo e a mata começou a atrair peregrinos que iam pedir as bênçãos de Deus. Para proteger o sítio sagrado, em 1643 o papa Urbano VIII decretou a excomunhão sumária de qualquer cristão flagrado impactando a reserva do Buçaco. Já em Malta, um ilhote foi declarado área protegida em 1746, para impedir a coleta descontrolada de um fungo que só crescia ali e que tinha propriedades medicinais. Somente no século XIX ganha força a ideia de se proteger áreas naturais para a recreação e contemplação. Seu principal defensor foi John Muir, um escocês educado nos Estados Unidos. É essa corrente de pensamento a principal força por trás da criação dos parques nacionais, tipo de área protegida destinado à conservação do meio ambiente com o objetivo primordial de proporcionar o desfrute da natureza, por meio de visitas e passeios. Raymundo Ottoni de Castro Maya é um conservacionista ligado a essa última escola de pensamento. Sua aproximação com as causas conservacionistas não vem da ciência, de atividades comerciais, nem da religião. Castro Maya desenvolveu seu amor pela natureza desde a infância, que passou na residência da família no Alto da Boa Vista, arrabalde montanhoso do Rio de Janeiro. O jardim de sua casa confundia-se com as matas da Floresta da Tijuca. Nem cerca havia a separar uma da outra. Nas suas brincadeiras de criança e aventuras da puberdade, Castro Maya não conhecia limites. Bastava andar um pouquinho e pronto: a trilha já extrapolava a propriedade e adentrava o parque.
"(...) quando o rei da Bélgica, Alberto, visitou o Rio de Janeiro em 1920, foi logo levado à Floresta da Tijuca. O mesmo sucedeu com Albert Einstein, em 1925, e com Rudyard Kippling, em 1927."
Sua juventude coincidiu com o nascimento do montanhismo no Brasil e com a revalorização das atividades esportivas entre as elites nacionais. Tinha 25 anos de idade em 1919, quando foi fundado o Centro Excursionista Brasileiro, mais antigo clube de montanhismo do país. Em seus longos passeios a pé ou a cavalo pelas matas da Tijuca, Castro Maya entrou em contato com a fina flor da juventude Fluminense, que exercia os prazeres do excursionismo, a mais nova moda da capital da República, rivalizando em popularidade com o remo e o futebol. Nesse contato foi se formando o conservacionista. Era uma época em que a Floresta estava associada às elites que moravam na então Capital Federal. A Tijuca era a jóia da Cidade Maravilhosa, exibida com orgulho para todos os visitantes ilustres, fossem políticos, cientistas ou literatos: quando o rei da Bélgica, Alberto, visitou o Rio de Janeiro em 1920, foi logo levado à Floresta da Tijuca. O mesmo sucedeu com Albert Einstein, em 1925, e com Rudyard Kippling, em 1927, para citar apenas alguns. Filho de uma família de intelectuais, Castro Maya se beneficiou da vasta biblioteca que seu pai mantinha em casa e que depois foi muito avolumada pelo próprio Raymundo. Leu avidamente os viajantes como John Luccock, Spix e von Martius, Rugendas, Wilhelm Theremin, o príncipe Maximiliano Wied-Neuwied, Jacques Arago e Maria Graham entre outros. Eram relatos de europeus impressionados com a exuberância da floresta tropical do Rio de Janeiro. Teciam elogios à sua incomparável beleza, seu fascinante verdor, sua inesgotável variedade de espécies. Alguns, como Luccock, já alertavam para o precoce desmatamento das matas da então capital do Império brasileiro.
Parque Nacional da Tijuca . Foto: Peterson de Almeida
Pedra da Gávea. Parque Nacional da Tijuca. Foto: Peterson de Almeida
Sua personalidade multifacetada, entretanto, não ficava por aí. Castro Maya era um atleta habilidoso. Competiu pelo Fluminense, time para o qual torcia fervorosamente, cujas cores defendeu no atletismo e onde socializou com os Guinle, os Cox, os Coelho Netto entre outros intelectuais e capitães de indústria daquele tempo. Aprendeu muito nas longas conversas e no convívio social. Por outro lado, sua paixão pelas artes o pôs em contato com gente do calibre de Cândido Portinari, José Olympio, Burle Marx, José Mindlin e Jean Manzon. Foi amigo de Roberto Marinho, com quem compartilhou os prazeres da caça submarina e da pesca desportiva, passando a ser assíduo frequentador de Arraial do Cabo. Seja por que pertencia à elite da época, em cujas conversas e eventos sociais a questão da preservação da natureza começava a ser debatida com alguma profundidade, seja porque tinha o amor pela natureza próprio daqueles que a frequentam, Castro Maya foi aos poucos despertando sua veia conservacionista.
"Atualizado com o que havia de mais moderno na área ambiental em sua época, Castro Maya sonhava em transformar a Tijuca em um parque nacional nos moldes do que vira in loco no exterior"
Em 1934, realizou-se no Rio de Janeiro a primeira Conferência Brasileira de Proteção à Natureza, trazendo o tema para o centro da pauta nacional. Um dos maiores resultados palpáveis dessa Conferência foi a criação dos três primeiros parques nacionais do Brasil: Itatiaia, em 1937, e Serra dos Órgãos e Iguaçu, em 1939. Participou das discussões em torno da Conferência gente que frequentava os mesmos círculos que Castro Maya, como o jornalista Armando Magalhães Corrêa (que desbravou a Pedra Branca) e a bióloga Bertha Lutz (que era habituée da Serra da Bocaina). Assim como eles, Raymundo aliava erudição interdisciplinar ao prazer de frequentar as belezas naturais do Rio de Janeiro. Foi logo atraído para o debate da conservação no Brasil. Para entender melhor o que se discutia e qual era o objetivo final do manejo de unidades de conservação, passou a incluir em suas viagens ao estrangeiro extensas excursões a parques nacionais. Dedicou então alguns anos a visitas aos parques da Argentina, dos Estados Unidos e Canadá. Gostou do que viu e, em 1936, comprou a Fazenda Cachoeira Dourada em Goiás, onde fez alguns experimentos em administração de uma propriedade com a natureza em seu estado mais conservado. Em 1938, teve a primeira oportunidade de colocar em prática o que aprendera. A convite do governo, participou da equipe que redigiu o Código de Pesca Brasileiro. A peça legal foi pioneira em exigir que novas barragens deveriam ter “obras que permitam a conservação da fauna fluvial, facilitando a passagem dos peixes” além de outros artigos de cunho conservacionista. Em 1943, quando foi convidado para dirigir a Floresta da Tijuca, já tinha sólidos conhecimentos da gestão e do manejo de unidades de conservação, que foram postos em prática em combinação com os contatos que tinha na alta sociedade, sobretudo nas áreas política e artística, e com os recursos financeiros de seu próprio patrimônio, que ele aportou ao Parque. Portanto, não é de surpreender que o período que passou à frente de sua administração, embora tenha durado apenas cerca de três anos, tenha entrado para a história da Floresta da Tijuca. Atualizado com o que havia de mais moderno na área ambiental em sua época, Castro Maya sonhava em transformar a Tijuca em um parque nacional nos moldes do que vira in loco no exterior, ou como ele mesmo escreveu: “uma amostra de um parque nacional [...]. Naturalmente era uma miniatura do que se poderia fazer em todo o país, aproveitando as belezas naturais e defendendo-as da “civilização que entra com o machado devastador, derrubando as matas e aproveitando o húmus da terra para pouco depois abandoná-la”[1].
"Castro Maya compartilhava a visão de John Muir de que os parques nacionais têm o objetivo primordial de manter a ligação atávica do homem com a natureza."
Para transformar a Tijuca nessa “miniatura de parque nacional”[2], Castro Maya relegou suas empresas a um segundo plano, dedicando a maior parte de seu tempo à Floresta. Emulou alguns amigos com quem convivera. De João Coelho Netto, o Preguinho, copiou a recusa de receber salário, aceitando dirigir a Floresta em troca de um cruzeiro por ano[3]. De Rockefeller, cuja amizade prezava muito, copiou o mecenato de que a história tradicional registrou principalmente a parte artística. Poucos sabem que a família Rockefeller, muitas vezes anonimamente, adquiriu e doou extensas áreas para os parques nacionais de Grand Teton, Acadia, Great Smoky Mountains, Yosemite e Shenandoa. Sem a riqueza inesgotável dos Rockefeller, mas com generosidade comparável, Castro Maya não dividiu seus esforços e dedicou-se a fazer da Tijuca um verdadeiro parque nacional. E o fez com maestria. A Tijuca que Castro Maya nos legou é um parque nacional no sentido estrito do termo e da definição. Não é apenas uma reserva hermeticamente fechada ao público, destinada somente à pesquisa e à preservação. Castro Maya compartilhava a visão de John Muir de que os parques nacionais têm o objetivo primordial de manter a ligação atávica do homem com a natureza. Acreditava que só essa ligação poderia gerar um grupo de conservacionistas dedicados. Sua gestão valorizou o meio ambiente na mesma medida em que investiu na infra-estrutura de ecoturismo, conforme relata em detalhes na presente obra. Suas ideias são hoje comuns no mundo inteiro. Existe até um mantra criado para representá-las: “conhecer para conservar”. Infelizmente, contudo, mesmo no Brasil de hoje Castro Maya provavelmente ainda não seria visto com bons olhos pelos dirigentes das instituições que zelam por nossos parques onde, com poucas excessões, quase não existe infra-estrutura turística e a visitação não é prioridade.
Trilha Transcarioca. Foto: peterson de Almeida
Trilha Transcarioca. Foto: peterson de Almeida
"Seu sonho de transformar a Floresta da Tijuca em parque nacional não se realizou durante sua gestão. A exoneração de Castro Maya, entretanto, não foi capaz de ofuscar seu trabalho nem seus ideais"
Que esperar então de seus antecessores há 50 anos? Castro Maya transformou a Tijuca no parque mais bem estruturado do Brasil, o que ainda é em nossos dias. Paradoxalmente, foi essa visão moderna e bem implementada que impediu que um parque nacional de fato como era a Floresta não ganhasse o título a que fazia jus. Como mesmo relatou Castro Maya, “em vez de encontrar receptividade entre os representantes do Serviço Florestal, foi justamente ali que esbarrei em sistemática oposição”. Seu sonho de transformar a Floresta da Tijuca em Parque Nacional não se realizou durante sua gestão. A exoneração de Castro Maya, entretanto, não foi capaz de ofuscar seu trabalho nem seus ideais. Nos anos que se seguiram, intensificou-se a pressão para que a Floresta fosse elevada à categoria de parque, o que finalmente ocorreu no centenário do reflorestamento, em 1961. Inicialmente, chamou-se Parque Nacional do Rio de Janeiro, já que, além da Tijuca, abarcava as Pedras da Gávea e Bonita, a Serra da Carioca e as chamadas florestas do Andaraí e da Covanca. O legado do industrial para a conservação, entretanto, não se resume à sua gestão da Floresta da Tijuca, nem às suas ideias arrojadas. Em 1963, Castro Maya doou ao usufruto público sua propriedade do Açude com a mata adjacente de 151.132m². Embora essa reserva seja hoje administrada pelo Instituto Brasileiro de Museus, ela é contígua ao Parque Nacional da Tijuca ao qual se une por meio da Trilha Transcarioca. Com efeito, não há divisória física entre a antiga residência de Castro Maya e a Floresta da Tijuca. São de fato uma só floresta pública, cuja história é comum e cujos destinos são indissociáveis. Que esse legado sirva de tributo a um dos maiores – e menos reconhecidos – conservacionistas da história do Brasil e que continue recebendo visitantes de braços abertos para ajudar a formar uma consciência ecológica conducente a que um dia finalmente, como reclamava Castro Maya, “os parques nacionais brasileiros deixem de serem áreas reservadas sem atrativos turísticos, e neles se observem medidas de defesa da fauna e da flora, cuja preservação é o motivo de sua existência”[4].
Notas: [1] Castro Maya, Raymundo Ottoni de. 1967. A Floresta da Tijuca. Rio de Janeiro: Bloch. [2] Idem. [3] Quando o profissionalismo foi introduzido no futebol carioca, Preguinho recusou-se a receber salário, passando a defender o Fluminense Football Club por um valor simbólico. [4] Idem.
Castro Maya John Muir

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Médico Clínico e Sanitarista - Doutor em Saúde Pública - Coronel Reformado do Quadro de Dentistas do Exército. Autor dos livros "Sistemismo Ecológico Cibernético", "Sistemas, Ambiente e Mecanismos de Controle" e da Tese de Livre-Docência: "Profilaxia dos Acidentes de Trânsito" - Professor Adjunto IV da Faculdade de Medicina (UFF) - Disciplinas: Epidemiologia, Saúde Comunitária e Sistemas de Saúde. Professor Titular de Metodologia da Pesquisa Científica - Fundação Educacional Serra dos Órgãos (FESO). Presidete do Diretório Acadêmico da Faculdade Fluminense de Odontologia. Fundador do PDT, ao lado de Leonel Brizola, Darcy Ribeiro, Carlos Lupi, Wilson Fadul, Maria José Latgé, Eduardo Azeredo Costa, Alceu Colares, Trajano Ribeiro, Eduardo Chuy, Rosalda Paim e outros. Ex-Membro do Diretório Regional do PDT/RJ. Fundador do Movimento Verde do PDT/RJ. Foi Diretor-Geral do Departamento Geral de Higiene e Vigilância Sanitária, da Secretaria de Estado de Saúde e Higiene/RJ, durante todo o primeiro mandato do Governador Brizola.